
Esta História começa com o nascimento de um menino, a 15 de Agosto de 1769, na ilha da Córsega, no Mar Mediterrâneo. Apenas um ano antes, em 1768, a ilha tinha sido vendida, pela República de Génova, ao Reino da França. Na altura, a Itália era composta por vários estados diferentes, alguns Repúblicas, outros Ducados, outros Reinos. Génova tinha sido uma das mais importantes repúblicas, sendo famosa pelo seu comércio com o Oriente (e, por isso, grande rival da República de Veneza). Mas, em 1768, os seus dias de glória já se tinham eclipsado e os habitantes da Córsega fizeram pressão, junto do governo genovês, para que este vendesse a ilha aos Franceses. Era Rei Luís XV,
o bem amado, pai do último rei francês, Luís XVI, morto aquando da Revolução Francesa (17891799).
Luís XVI é também conhecido por causa da sua esposa, Maria Antonieta. Terá sido ela a trazer, para a França, os famosos Croissant's.
Esse menino nasceu já francês mas toda a vida falou com um sotaque italiano que o tornou alvo de chacota quando era novo e estudava no continente (francês), num Colégio Militar.
Formou-se, em 1785, como Segundo Tenente de Artilharia. Mais tarde, viria a destacar-se na Revolução Francesa e eventualmente a governar a França e a conquistar militarmente grande parte da Europa. Esse menino chamava-se
Napoleão Bonaparte (nasceu «Napoleone di Buonaparte» mas afrancesou o seu nome para «Napoléon Bonaparte»).

Ora Napoleão empreendeu uma série de batalhas e conquistas militares no Continente Europeu e o seu génio militar permitiu-lhe vir a dominar, além da França, a Espanha, a Itália, os Estados Germânicos (na altura ainda não havia Alemanha) e a Polónia. Fruto da força que o exército e a liderança de Napoleão tinham, eram também aliados da França a Áustria e a Prússia (antigo estado germânico, que unificou, no século XIX, toda a Alemanha e que foi desfeito piliticamente após a II.ª Guerra Mundial, sendo o seu território sido maioritariamente entregue à Polónia, parte à Alemanha e parte à Lituânia). Na sua expansão era invitável o confronto com a Grã-Bretanha, com um vasto império colonial e senhora dos mares. Não podendo enfrentar o poderio naval inglês, decretou, em 1806, um Bloqueio Continental, pelo qual proibia os territórios que tinha sob controlo de fazerem comércio com a Inglaterra. Esperava, dessa forma, estrangular economicamente os ingleses. Mas um país europeu, que tinha laços comerciais com a Inglaterra desde a Idade Média, recusou a ordem de Napoleão.
A Aliança Anglo-Portuguesa foi celebrada em 1373 (no reinado de D. Fernando) e foi reforçada pelo Tratado de Windsor, datado de 1386 (no reinado de D. João I). O Tratado de Windsor foi firmado pelo casamento de D. João I com Filipa de Lencastre (filha do Duque de Lencaster, um nobre extremamente influente na coroa inglesa). Com a ajuda inglesa providenciada pelo sogro, D. João conseguiu derrotar as tropas espanholas do marido da sua sobrinha (a princesa herdeira Beatriz), tornou-se Rei e foi pai da Ínclita Geração, os príncipes portugueses que se detacavam pelos seus dotes pessoais e que impulsionaram Portugal para a sua Época de Ouro: os Descobrimentos (em particular D. Henrique).

Em 1500, o navegador português Pedro Álvares Cabral, desembarcou nas costas de uma terra desconhecida a que deu o nome de Terra da Vera Cruz. A colonização portuguesa foi-se alastrando pelo continente, ao longo dos séculos, ultrapassando inclusivamente o traçado do Tratado de Tordesilhas, o segundo tratado no qual Portugueses e Espanhóis dividiam o Mundo em duas áreas de influência.
Em 1479, foi assinado o Tratado de Alcáçovas, uma linha que dividia o Globo horizontalmente a sul do Cabo Bojador no paralelo 27. Por politiquices junto do papa Alexandre VI (espanhol de nascimento) e a fim de os espanhóis poderem reclamar as terras que Colombo tinha descoberto, o Tratado de Alcáçovas foi abolido e o Tratado de Tordesilhas foi assinado.
Ver o artigo Canarias et ignotus tractatus para mais sobre este tratado e como as Canárias foram cedidas aos Espanhóis.Até ao século XIX, o Brasil permaneceu como a maior colónia e a maior fonte de riqueza da Coroa Portuguesa: o Império Português no Oriente foi perdido para os Holandeses, como visto em
A lágrima do leão mas o Brasil, apesar das temporárias conquistas holandesas, permaneceu português.

Até que, em 1806, Napoleão decretou o Bloqueio Continental. Portugal recusou e Napoleão decidiu enviar as suas tropas para conquistarem os portos portugueses e forçarem o Bloqueio à Inglaterra. Em 1807, a França e a Espanha assinaram o Tratado de Fountainbleau, pelo qual os dois países acordaram dividir Portugal em 3 Reinos:
~ a Lusitânia Setentrional (terras entre o Rio Minho e o Rio Douro), que seria governado pelo (já extinto) Reino da Etrúria, uma das nações existentes na altura na península itálica e governada pela filha do Rei Espanhol Carlos IV;
~ Algarves (terras a sul do Rio Tejo), que seria governado por um espanhol;
~ Portugal (terras entre o Rio Douro e o Rio Tejo), que se tornariam um território francês.
Para fazer cumprir o acordo, as tropas francesas comandadas pelo General Jean-Andoche
Junot (e não por Napoleão), invadiram Portugal. A coroa portuguesa consegiu escapar e fugiu para o Brasil. Entretanto, os Franceses voltaram-se contra os seus aliados Espanhóis e ocuparam militarmente a Espanha. Em Portugal, apesar das suas vitórias iniciais, as tropas francesas foram repelidas (não sem antes pilharem tesouros portugueses. Vestígio disso são os danos provocados nos túmulos reais existentes no Mosteiro da Batalha), retiraram em 1810 e derrotadas finalmente em 1814.
Existe, na cidade do Porto, na Rotunda da Boavista, um Monumento aos Heróis da Guerra Peninsular: uma coluna com 45 metros de altura encimada por uma estátua de um leão (a vitória Luso-Inglesa) sobre uma águia derrubada (o Império Francês). Ao contrário do que a alguns terá ocorrido, a estátua nada tem a ver com o mundo futebolístico, é uma homenagem ao espírito independente português.D. Maria I continuou a governar Portugal a partir da colónia com o seu filho João (futuro Rei João VI) a seu lado e a capital portuguesa passa a ser a cidade do Rio de Janeiro. Os portos brasileiros foram então abertos ao comércio com outras nações (até então apenas podiam comerciar directamente com portos portugueses). A economia brasileiro floresce até que, em 1815, ganha o estatuto de Vice-Reino e Portugal para a ser o Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves. O Brasil não era mais uma simples colónia, ganhava um estatuto em pé de igualdade com Portugal. A perda do dinheiro brasileiro e a distância da corte leva a descontentamentos em Portugal (nomeadamente a Revolução Liberal, em 1820, no Porto). D. João VI regressa então a Portugal, 6 anos após a derrota das tropas francesas. O Brasil volta à sua condição de simples colónia e D. João VI deixa o seu filho herdeiro, D. Pedro, a governar o Brasil.

Mas, para contribuir para a complexidade que este século teve na História portuguesa, as coisas complicaram-se ainda
muito mais:
D. João ordena que D. Pedro volte a Portugal. Este recusa-se e declara a independência do Brasil com ele como Imperador: D. Pedro I do Brasil, em 1822.
Entretanto morre D. João VI e parece ter indicado, por carta, como seu sucessor, D. Pedro.
Ora este é Imperador do Brasil e não pode unir Portugal e Brasil desta vez com o Brasil como principal reino. Então, na qualidade de D. Pedro IV, Rei de Portugal (durante apenas 7 dias), dá uma nova constituição ao país (uma constituição liberal e mais limitadora dos poderes régios) e abdica em favor da sua filha, Dona Maria da Glória de Bragança (futura Dona Maria II) com a condição de esta (com apenas 7 anos) casar com o seu tio paterno, D. Miguel e jurar manter a Carta Liberal (a nova constituição). Ora D. Miguel I não apreciava a constituição liberal do irmão e, como regente do reino, ignorou-a. No Brasil, entretanto, as atitudes autoritárias de D. Pedro levaram a que os brasileiros o forçassem a abdicar do trono brasileiro em favor do seu filho, D. Pedro II do Brasil (1825-1891), o segundo e último imperador do Brasil. D. Pedro II do Brasil subiu ao poder em 1841 e governou até 1889, tendo abolido o comércio negreiro em 1850 e a escravatura em 1888, o que provocou descontentamento entre os fazendeiros brasileiros, o que levou no ano seguinte, em 1889, a um golpe de estado no Brasil, em que foi deposto D. Pedro II e implantada a República.

D. Pedro I do Brasil tinha sido forçado a exilar-se e a regressar à Europa, em 1831. Chegado à Europa, reuniu Homens e armas e invadiu Portugal, com o intuito de fazer prevalecer a constituição liberal face ao absolutismo de D. Miguel. Após longas e duras batalhas, os liberais de D. Pedro venceram e D. Miguel foi forçado a exilar-se na Áustria. D. Pedro IV, doente, pediu às cortes portuguesas para declararem a maioridade de D. Maria, de 15 anos, para que esta assumisse o trono de Portugal.
Portugal sobreviveu a esta Guerra Civil portuguesa (1828-1834), mas emergiu um reino mais pobre (perdera a maior e mais rica das suas colónias) e exangue da luta fraticida que acabara de vivenciar. Simultaneamente a população portuguesa via-se com mais direitos e com novos sentimentos de liberdade e vontade de se exprimir.

E é num reino empobrecido, habituado a viver do ouro brasileiro e mais ainda amarrado ao comércio inglês, como a sua única fonte de riqueza, que surge a
Geração de 70. Este foi um grupo de estudantes de Coimbra (liderado intelectualmente por Antero de Quental) que se rebelou contra a arte que se fazia na altura, contra a sociedade em que viviam, contra pesadas e estagnadas as concepções históricas, sociais e filosóficas da sua época. Este grupo de escritores viria a fazer as supracitadas Conferências do Casino, onde discutem, aberta e publicamente, as causas para o declínio de Portugal e para a sua tão grande dependência do que obtinha da sua colónia brasileira.
Nascido em Ponta Delgada, na ilha de S. Miguel, arquipélago dos Açores, evidenciou-se um jovem de nome
Antero Tarcínio de Quental (1842-1891). Era filho de Fernando de Quental, que lutou ao lado de D. Pedro IV na Guerra Civil (que instaurou o liberalismo em Portugal) e neto de André da Ponte Quental, que lutou contra as invasões francesas e foi amigo do poeta Bocage. Provinha, por isso, de uma família de arreigados defensores da pátria e do liberalismo, tradição que Antero de Quental prosseguiu na sua vida. Teve sempre um espírito lutador e idealista, pugnando pela igualdade e pela justiça social. Em 1852, com 13 anos, vem viver com a mãe para Lisboa e, em 1858, com 18 anos, ingressa na Faculdade de Direito de Coimbra (tendo-se formado em 1864, com 22 anos).

No ano seguinte à sua formatura em Direito, envolveu-se numa disputa literária com o seu antigo professor, António Feliciano de Castilho, que viria a ser conhecida por
Questão Coimbrã (pela cidade onde ocorreu). Castilho advogava uma poesia ultra-romântico que, aos olhos de Antero de Quental, era decadente, torpe e beato. Para Antero, a poesia deveria pugnar pelo Realismo, a descrição da vida tal como é, com todo o sofrimento, pobreza e injustiça que contém. Dessa forma, a poesia tem um papel mais do que decorativo ou estético: é também uma arma de combate à injustiça social. Nesta disputa animada, foi o Realismo de Antero que saiu vitorioso sobre o Ultra-Romantismo de Castilho. No ano seguinte, em 1866, foi para Lisboa, para exercer a profissão de tipógrafo, profissão que exerceria, em 1867 e 1868, em Paris, para onde se mudou.
Nesse ano, 1868, regressa a Lisboa, onde forma o Cenáculo (também conhecido como a Geração de 70), um grupo de intelectuais (maioritariamente escritores) que se tinham conhecido em Coimbra nos seus anos estudantis. O Cenáculo era contestatário, apontando o dedo à sociedade, aos seus costumes decadentes e ao servilismo social que se vivia, nesses anos após a independência do Brasil e a cada vez maior dependência do comércio com a Inglaterra. Decidem, então, realizar uma série de conferências, que ficaram conhecidas como Conferências do Casino, onde expunham as suas ideias e denúncias para a decadência social portuguesa. Foram realizadas 5 conferências:
~ "O Espírito das Conferências", por Antero de Quental;
~ Causas da Decadência dos Povos Peninsulares", por Antero de Quental;
~ "Literatura Portuguesa", por Augusto Soromenho;
~ "O Realismo como nova expressão da arte", por Eça de Queiroz;
~ "O Ensino", por Adolfo Coelho;
Antero culpava, para o atraso português:
~ A
contra-reforma religiosa, que aprofundou o atraso intelectual e científico do país;
~ A
centralização política, herdada do Absolutismo e a que o liberalismo não tinha posto cobro, mantendo o país subdesenvolvido e dependente da capital;
~ A
herança económica dos Descobrimentos, que tornou o país dependente dos bens que lhe chegavam das suas colónias;
Mas as autoridades políticas e religiosa não apreciaram as Conferências e estas foram proibidas, havendo mais 5 que não chegaram a se realizar. O país fez «ouvidos moucos» aos conselhos e avisos do Cenáculo...

Em 1890, os avisos do Cenáculo concretizam-se, com o
Ultimato Inglês que exigia, a Portugal, que se abstivesse das pretensões de ligar, por terra, as colónias de Angola e Moçambique (o território que agora é o Zimbabué), o chamado Mapa Cor-de-Rosa. A Inglaterra pretendia unir, com uma linha ferroviária, as suas colónias no Sul da África com as do Norte de África. A Inglaterra, sentindo a fraqueza portuguesa, optou por exigir e ameaçar os portugueses, enquanto se entendia com a França, que tinha já uma linha ferrovária que se estendia da costa oriental à costa ocidental africanas (após longos séculos de animosidade entre os dois países, este acordo estreitou os laços entre os dois países, levando a que estes, tradicionais inimigos e rivais, se tornassem os aliados que o século XX testemunhou, na I.ª e II.ª Guerras Mundiais). A humilhação nacional foi sentida por todos os portugueses e viria a levar, em 1908, ao regicídio (onde morreu D. Carlos) e, em 1910, à abdicação de D. Manuel II e à implantação da República.
Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens, dois exploradores portugueses, tinham, entre 1884 e 1885, feito a travessia a pé de Angola a Moçambique, no intuito de cartografaram a região e reforçarem as pretensões portuguesas na região, mas 5 anos depois, a Inglaterra ultimou Portugal a abandonar essas pretensões.Em 1891, Antero de Quental, já doente de Doença Bipolar (uma psicose maníaco-depressiva), muda-se para a sua nativa Ponta Delgada, nos Açores, onde acaba por se suicidar, num banco de um jardim da cidade. Esse jardim chama-se agora Jardim Antero de Quental e tem um memorial em hora de Antero, um dos filhos mais ilustres da região (a par de Manuel de Arriaga, primeiro presidente da República, a poetisa e deputada Natália Correia, entre outros vultos nacionais).

Jardim Antero de Quental, Ponta Delgada, Açores, onde o poeta é homenageado.
Mors-Amor
Esse negro corcel, cujas passadas
Escuto em sonhos, quando a sombra desce,
E, passando a galope, me aparece
Da noite nas fantásticas estradas,
Donde vem ele? Que regiões sagradas
E terríveis cruzou, que assim parece
Tenebroso e sublime, e lhe estremece
Não sei que horror nas crinas agitadas?
Um cavaleiro de expressão potente,
Formidável, mas plácido, no porte,
Vestido de armadura reluzente,
Cavalga a fera estranha sem temor:
E o corcel negro diz: "Eu sou a Morte!"
Responde o cavaleiro: "Eu sou o Amor!"
Antero de Quental
Outros poemas, de Antero e de outros autores, podem ser encontrados no interessante blog, pleno de poesia de autores portugueses e estrangeiros, Nox.
Para uma existência poética e encantada, de quem o Cognosco usufrui da amizade e companhia, ver ainda </i>A Papoila.