Diário das pequenas descobertas da vida.
~ Está-me a apetecer uma salada de tomate. É o meu legume favorito!
~ Pode até ser, mas não sabes que o tomate é um fruto?
~ Um fruto? Não digas asneiras, nem sequer é doce!
~ E quem te disse que um fruto tem de ser doce? O limão é doce?!
~ Mas concordamos que é um vegetal, certo?! Bom, mais um pouco e ainda lhe chamas uma hortaliça!
~ E já agora, é um fruto ou uma fruta?
~ ?!Eis uma conversa perfeitamente plausível numa qualquer mesa de uma qualquer esplanada. E, na verdade, há esta questão: «o tomate é um legume ou é um fruto?»
O que identifica algo como um fruto, como um legume, como um vegetal?

A verdade é que há duas definições diferentes do que é um fruto: a classificação botânica e a classificação culinária. Das duas, a culinária é uma definição inexacta e sujeita a contradições. Tanto é assim que é difícil expressar a definição culinária de «fruto». De um modo geral, culinariamente pode considerado o produto botânico doce que é geralmente comido à sobremesa e não como prato principal (apesar de ser cada vez mais frequente verem-se pratos principais confeccionados com frutas, o que ainda baralha mais a questão). Culinariamente, um vegetal é considerado qualquer parte comestível de uma planta que tenha um sabor salgado e não doce (se bem que um amendoim tenha um sabor salgado e seja culinariamente classificado como um fruto).
As definições mais exactas vêm da Botânica:
~ «o fruto é o conjunto dos órgãos vegetais que sucedem à flor e contêm a semente»;
~ «um legume é uma planta leguminosa (ou uma das suas sementes) usada como alimento»;
~ «vegetal é tudo quanto seja relativo ou pertencente ao reino vegetal»;
E quanto ao tomate? É obviamente um vegetal, mas será um legume ou um fruto?
Há que esmiuçar as definições científicas para uma resposta clara.

O tomate pertence à família
Solanaceae, uma família de plantas que dão flor.
Há muitas espécies (agrupadas em cerca de 32 géneros), a maioria comestível mas algumas venenosas. Da família das solanáceas, além do tomate, encontra-se a batata, a beringela, o tabaco, o pimento, a petúnia, a mandrágora e a beladona.
O tomate surgiu na América e foi cultivado pelos ameríndios muito antes da chegada dos europeus. No velho continente, as espécies da família
Solanaceae conhecidas eram as venenosas mandrágora e beladona (apesar da beringela ter surgido na Ásia, onde era cultivada, só chegou à Europa no início XVI, com os Descobrimentos).
Assim, como visto em
A derrota de pizza, que fala de Marco Pólo, contemporâneo de D. Dinis, e do que foi fazer à China, os Europeus tiveram uma primeira reação negativa em relação ao tomate, já que se parecia muito com o fruto da venenosa beladona. Mas rapidamente tornou-se apreciado e muito cultivado pelo Mundo fora.
Mas isto não responde à questão... Analise-se o que é um legume.

Um legume é o fruto das plantas da família
Leguminosae. Os frutos dos legumes surgem como vagens, casulos fechados no interior dos quais se formam os frutos contendo as sementes. Geralmente as vagens abrem espontaneamente, libertando os frutos no seu interior. A vagem é geralmente de consistência mole.
A excepção é o geralmente mal-classificado amendoim. Em culinária, o amendoim é tido como uma noz, mas na verdade é um legume que se desenvolve debaixo da terra e, por isso, a vagem é dura e não se abre espontaneamente para libertar as sementes. Uma noz (o que inclui, além dos frutos da nogueira, a bolota, a avelã, a castanheira, entre outras) é um fruto seco com apenas uma ou duas sementes no interior de uma casca dura. Daqui surgirá a confusão quanto ao legume amendoim.E quanto aos frutos, qual a sua definição?
Primeiro há que distinguir duas palavras que, muito semelhantes (e muitas vezes erradamente tomadas como sinónimas) são diferentes: «fruta» e «fruto». Um fruto é uma estrutura que se forma nas plantas superiores pelo amadurecimento do ovário, quando a planta é fecundada, contendo, no seu interior, as sementes. Uma fruta é um termo mais culinário, que se refere aos frutos de plantas que são carnudos e doces.
Há duas categorias de frutos, os simples e os compostos.
Os frutos simples resultam da fecundação de apenas um ovário.
Há os frutos simples carnosos (com um interior mole e suculento), como as
maçãs, pêras, laranjas, abacates,... (genericamente os que são conhecidos como
frutas). Há ainda os frutos simples secos, como as nozes, as avelãs, os legumes, ...
Os frutos compostos resultam de mais de um ovário fecundados.
Há os frutos compostos agregados (resultantes de vários ovários na mesma flor) como os morangos, as framboesas,... (como que fossem «gémeos verdadeiros», mais correctamente gémeos homozigóticos). Há ainda os frutos compostos múltiplos (resultantes de vários ovários de várias flores que crescem juntas umas às outras) como as amoras, os ananazes, os abacaxis,...
As pinhas e outros cones de coníferas não são frutos compostos, apesar da sua aparência e as sementes cresceram na mesma estrutura, porque não se originam de ovários fecundados. As pinhas não são portanto frutos e, muito menos, frutas. Na verdade, cada pinhão surge do amadurecimento de um óvulo, não sendo a pinha um ovário amadurecido. Para uma relação entre pinhas e coelhos, ver o artigo FibonacciAlgumas características do tomate íncluem o facto de serem um fruto carnudo com várias sementes contidas no interior de um ovário amadurecido que forma todo o fruto. Um fruto que tem essas mesmas características é a conhecida
uva! Os frutos que são inteiramente formados pelo ovário amadurecido são designados como
bagas, na qual todo o fruto é comestível. As maçãs, por exemplo, claramente têm no seu interior o ovário com as sementes e, à sua volta, a parte carnuda que se come.

Concluindo então, o que é um tomate?
É um fruto pois surge do amadurecimento de um óvulo de uma flor e contém, no seu interior, as sementes da planta.
É uma fruta pois é uma baga, como a uva, completamente constituído pelo óvulo amadurecido.
Não é um legume na medida em que não é nem tem vagens.
Outros frutos muitas vezes erradamente tidos como legumes são: a beringela (Solanum melongena), o pepino (Cucumis sativus), a courgette (Cucurbita pepo),
a abóbora (Abobra tenuifolia).
Querido Mauro: sempre vi o tomate como um fruto e não um legume. Logo no início do artigo me perguntei se não o seriam também os pimentos, pepinos, courgettes, abóboras e beringelas... Sob o ponto de vista culinária agora ia uma salada de tomate com umas tiras de pimento vermelho e umas fatias de maçã... (gosto de maçã na salada).
Este artigo faz "água na boca" Beijo
De
Mauro a 21 de Maio de 2007 às 22:12
Bem, «Maria Papoila», realmente abre o apetite. Especialmente por uma salada de pimentos... Mas devias ver o rosto de algumas pessoas quando são confrontadas com a ideia de que o tomate não é um legume mas sim um fruto.
Conclusão:
É preciso ter-se tomates para se fazer uma boa salada.
Mudando de assunto: E os tremoços não serão um marisco? É certo que também vão muito bem com a cerveja. Pelo menos há quem diga que foi o nosso grande e querido Eusébio que tal descobriu...
De
Mauro a 22 de Maio de 2007 às 21:45
Como, «deprofundis», em muitas outras situações na vida... Quanto ao tremoço, já no artigo «Sabe a mais» se explicou a razão porque sabe bem o tremoço em conserva de água salgada: está ligada ao 5º sabpr (o sabor umami). O tremoço é a vagem do tremoceiro. Ou seja, o tremoço é um legume (é a vagem da Lupinus Albus, uma planta da família das leguminosas, onde se incluem os feijões, ervilhas, amendoins, soja, as lentilhas e as favas). Mas será o tremoço um marisco ou será a lagosta um legume?! ;^)
De
collybry a 24 de Maio de 2007 às 21:30
Já começa a saber bem uma boa salada, gostei muito de ler todas estas informações, meu beijo e rastoooo
De
Mauro a 25 de Maio de 2007 às 19:22
Nas asas do colibri, todas as saladas sabem bem e seja quem for que aqui vem, sai com o infinito condensado em si. Obrigado pela visita e pelo rasto. Faltará, aqui no artigo, uam imagem/texto que explore mais um pouco do que é exactamente o ovário fecundado e a sua transformação no fruto. Está a ser ponderado...
De
brit com a 25 de Maio de 2007 às 21:23
Este blog foi nomeado para o prémio "Blog com Tomates". Para mais informações visite http://blogcomtomates.blogspot.com
De O Alcovital a 27 de Junho de 2007 às 16:59
Ora aqui está uma grande salada, tomatada ou, se preferirem, legumada!! Questão: Terão os marcopolianos ficado com medo das bruxas chinesas? Com certeza de que assim foi, como é sabido,as bruxas,bruxos e bruxinhas da Europa da idade média usavam as bagas, folhas e raízes, nada inocentes, da bela Atropa Beladonna, nos seus conciliabulos orgiásticos, para assim conseguirem visões e alucinações produzidas pelos alcalóides da dita planta. Assim se explica a catrefa de histórias de bruxas voadoras, metamorfoses em animais, lobisomens sedentos de sangue e muitas outras como essas. É claro que os pobres tipos quando viram o famoso tomate, não menos famoso que o famoso tremoço, pensaram que se tratava duma versão aumentada da dita Beladona, tão venenosa e alucinogénica como qualquer bela mulher, pois de facto os FRUTOS de ambas as plantas são muito semelhantes, apenas diferindo no sua dimensão, a Beladona tem frutos do tamanho de cerejas e o Tomateiro dá frutos com o tamanho que todos conhecem. Sim,os europeus não estavam interessados em ver que lobisomens poderia um bom tomate produzir... O Tomateiro e a Beladona pertencem à mesma família, as Solanáceas, que incluem uma vasta família de plantas-até cerca de 2000 espécies-entre as quais encontramos a Batata, beringela, pimentão e o mal-amado tabaco. Para terminar deixo-vos a salada final, a famosa "Pomada das Bruxas" era uma mistela feita a partir da Beladona em conjunto com outras plantas da mesma família que crescem esponteamente em Portugal e no resto da Europa, são elas o Estramónio, vulgarmente conhecido por figueira do inferno, o meimendro negro e a mandrágora, sendo esta última também usada em poções amorosas pois eram-lhe atribuídas propriedades fantásticas, muito devido ao facto de a sua raíz ser antropomórfica, isto é ter a forma semelhante ao corpo humano; outras estórias que se diziam da mandrágora era que nascia no solo debaixo do local onde um homem teria sido enforcado, isto porque quando se enforca um homem ele ejacula, e seria o sêmen do enforcado que daria origem à planta. Outra estória, e disso fala Shakespeare no seu "Romeu e Julieta", era que a mandrágora gritava quando era arrancada da terra e que ninguém podia ouvir o grito, sob pena de se converter em pedra, então era amarrado um cão à planta e quando o dono, já longe, o chamasse, ele arrancaria assim a planta. Muito mais poderia dizer do que se conta acerca das primas do tomate, mas receio que a salada se torne indigesta. Quem diria que os nossos queridos tomatinhos tinham umas amigas tão peculiares e ao mesmo tempo tão venenosas? Verdadeiramente interessante, mas também verdadeiramente mortal, não esquecer os miúdos da Madeira que no ano passado fizeram um chá da Bela Senhora, com o propósito de sentirem os efeitos alucinogénicos e que terminou com graves intoxicações e com a morte de um deles. Fico pelo tomate, esse pelo menos sei que faz muito bem, não vou ver bruxas a voar, mas também quem é que acredita em bruxas hoje em dia? Conselho turístico: Experimentem a festa da Tomatada em Espanha, mas levem o impermeável pois ali chovem, literalmente, tomates. Força no tomate Mauro!
De
Mauro a 28 de Junho de 2007 às 09:22
Bem, «O Alcovital», não sei em que medida me caberá deixar um comentário a este comentário, uma vez que ele é dirigido a um plural de pessoas e não a uma só. Mas fá-lo-ei, tendo em conta que me competem as honras de recepção da minha casa. Agradeço-te as informações que deixaste: algumas delas estão incluídas no artigo (neste ou no do Marco Polo), outras não. Em relação à «receita» para a «Pomada de bruxas», faltou só referir que era aplicada no aparelho genital externo feminino... A família biológica do tomate é extensa (foi referido) e inclui alguns inusitados parentes. É um tema interessante, penso que o teu comentário revela que foi apropriado a escrita do artigo. Obrigado.
De O Alcovital a 28 de Junho de 2007 às 15:15
Sim, realmente a minha cogitação pretendia responder um pouco a todos os comentários, com um certo humor -quem disse que aprender não é divertido?- que foram feitos a esse artigo bastante interessante. Talvez tenha fugido um pouco ao assunto, mas é assim mesmo, uma palavra puxa a outra. E conhecia diversas aplicações -ingerido, aplicado sobre pele, etc.- mas essa de aplicar no sexo das meninas desconhecia, seria talvez uma espécie de lubrificante? Eh eh eh
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